2015-06-01

Bárbara ao mundo

Há um cometa na Madalena que tem a qualidade de estar sempre visível e de ter um brilho constante. Esse brilho constante, dizem, é dos planetas. Também se aceita: afinal a Bárbara é tudo isso: cometa, planeta, universo.

No desporto tendemos a glorificar o sucesso, os títulos, a técnica, as estrelas, mas sabemos, quando estamos sentados nas bancadas de um pavilhão, que o nosso amor, a nossa admiração, nem sempre incide sobre os fortes - as mais das vezes torcemos pelos mais fracos ou pelos mais marcantes. Quando se assiste a um jogo ao vivo, olhamos e lemos o que bem entendemos no espectro do jogo: podemos seguir um só detalhe, um só jogador, um só fiscal de linha, durante o tempo todo. A verdade é que são todos os pormenores, juntos, que dão corpo ao jogo, não apenas os elementos centrais.
Hoje venho falar-vos da excelência que também se lê dessa forma. O nome deste tipo de excelência é conhecido: chama-se humanidade. Há muitos virtuosos que guardam a virtude só para si: a Bárbara estende-a pelo mundo. E destaco-a de um fim-de-semana onde houve vários campeões. Ontem, ao assistir, na nave de Esmoriz, a um jogo de voleibol da fase final de cadetes femininos onde se discutia o quinto lugar, entre a AA São Mamede e o C Atlântico da Madalena, os nossos olhos, num misto de ternura e admiração, seguiram sempre aquela menina número 17, do Atlântico da Madalena, do princípio ao fim do jogo, e estas linhas são uma crónica de celebração dela.
Bárbara ao mundo.
Porque a Bárbara, que fez dezasseis anitos o mês passado, merece um prémio qualquer, que não de latão, e já se faz tarde. Uma homenagem preliminar, se quiserem, antes do tempo todo passar sobre ela. Não será a única. Mas é única. Vemo-la e ouvimo-la desde pequenina progredir naqueles courts de voleibol, nos corredores, nas bancadas, sabemos que é impossível estarmos tristes à beira dela, passam os anos e ela não esmorece. Com o cabelo frisado preso num rabo de cavalo e um sorriso rasgado que leva ao limite em todos os jogos, tão ao limite que por vezes chora de intensidade, a Bárbara, capitã na derrota ou na vitória, corre os pavilhões deste país a abraços. Literalmente a abraços. Colegas de equipa, público, árbitros, adversários, todos já levaram o seu abraço doce que redime. Afinal, esteja em nós a tristeza da derrota ou o entusiasmo da vitória, o abraço da Bárbara é como um nível. Um nível é um instrumento que marca a horizontalidade de uma linha ou superfície, fundando-se na diferente densidade do ar e da água. Quando a bolha está quase a rebentar, o abraço da Bárbara apazigua. Ela toma as dores dos outros, muitas vezes à custa de si própria. E, se o comportamento dela fora do campo é por todos conhecido e apreciado - ainda ontem, sendo uma fase final, pudemos ver a Bárbara correr todas as equipas que estavam no pavilhão, depois de uma derrota, a abraços, alguns bem longos; a Bárbara comove porque nos mostra, afinal, onde está a substância do desporto -, o comportamento dentro do campo não é muito diferente da menina que corre os pavilhões há uns bons anos, com a voz rouca que protesta ou estimula, e é capaz de atravessar várias vezes o court todo a dar ânimo às companheiras, como, em jogo, numa mesma jogada, chega a servir, a ir ao chão salvar bolas perdidas e a atacar com eficácia.
Lembro-me de estar na bancada e, observando a Bárbara, comentar com o meu filho, que tem a honra de jogar no mesmo clube, que era há muito o fã número um daquela menina, daquela força da natureza. Depois do festival que ela nos proporcionou ontem, impus-me tirar-lhe esta fotografia escrita e deixá-la exposta aos anos. A Bárbara nunca vai envelhecer porque tem em si uma certa eternidade. A Bárbara é uma festa.
E corporiza muitos dos sentimentos que a timidez, a reserva, o pudor, não deixam outros tantos demonstrar: a Bárbara é afecto puro, o nosso e o dela. A Bárbara é ímpar.

Ontem, em Esmoriz, se a Bárbara olhasse do campo para a bancada, veria vários rostos comovidos com a sua beleza, que é toda e que é a todo o tempo. O prémio não é de latão, é de ouro: e a metáfora estafada serve-nos para o troféu. Bárbara de ouro.
O nosso troféu é ela própria.
Campeã absoluta em todas as modalidades e de qualquer forma que olhemos para ela.
As nossas lágrimas e os nossos sorrisos foram sempre acolhidos por ela.
Doravante as lágrimas ou o sorriso dela serão sempre acolhidos por nós.
Eis o pedestal que ela merece.
Eis Bárbara ao mundo.


PG-M 2015
foto propriedade de Esmoriz Ginásio Clube